Sobre Embankment #6



O impacto inicial que o contacto com o trabalho do Colectivo Embankment desencadeia, constrói-se das perplexidades primordiais e fundadoras da humanidade: as dúvidas, as inquietações e o mistério são a impressão digital da sua identidade.

Evidentemente que tudo é muito mais profundo, labiríntico e complexo — numa palavra: encriptado. Dizer encriptado é dizer que a sua leitura é, acima de tudo, um exercício de vontade e de discernimento. A nossa perspicácia, enquanto observadores, é permanentemente convocada transformando-nos em recriadores do trabalho que nos é apresentado. Mas a significação do termo estende-se à própria (inter)relação dos objectos dispostos, como uma pira sacrificial (congregação aparentemente caótica, mas de facto hierarquizada, de equipamento electrónico onde se evidencia, por um lado; a vertiginosa obsolescência da tecnologia que resulta do reconhecido processo de autofagia tecnológica, por outro; a infinita capacidade tentacular da intervenção artística em atingir e ligar territórios longínquos), criando uma poderosa atmosfera de sacralidade metafórica, sublinhada por uma penumbra espectral e pelo pulsar de um permanente registo sonoro tenso, intenso e intencional no espaço expositivo (Embankment #6).

Trata-se, portanto, de uma sacralidade forjada, profana e sem fé mas com crentes, sem dogma mas com um código, sem liturgia mas com oficiantes.

As coisas são claramente e cristalinamente o que são mas, paradoxalmente, são também o que não são; são uma realidade resultante de que se resolve na transmutação da realidade em, remetendo a outra(s) realidade(s) – aliás, não é tudo sempre assim?

E isto é um jogo deliberado de inteligências que se cruzam e dialogam na construção de um edifício artístico sólido, coerente e eficaz, que conduz directamente aos domínios da matéria, da carnalidade e do lúdico. 


Pedro Gamboa, Junho 2009